19 março 2009

Pálida




eu nao queria te dizer algo assim,
qualquer coisa,
eu não queria estar longe assim,
não queria que o texto fosse irregular assim,
eu nao queria tanta coisa,
tanta coisa.


agora que você tem idade suficiente para ser a mãe de uma criança no fim da infância, mas sua sorte e sua escolha, não foram essas, agora...o que será?


agora que as pessoas envelhessem a olhos vistos,
agora que eu não encontrei o mesmo que te faz feliz,
e as salas de espera estão cheias de gente inquieta,
quem vai juntar os trapos da história,
quem será sensato para não a repetir?


só pelo ensaio tardio desse momento,
me desculpo, mas não aguardo alento,
me dispo e dissipo, numa bruma de madrugada,
vou à sacada e me deixo cair,
dessa queda flutuo, abro os braços,
no meio do caminho lá pra baixo,
começo a subir, olha que estranho, a subir,
olha que movimento, tão estranho, tão estranho,
mas eu sei, estou subindo pra te encontrar.


agora, que não é a hora, nem o lugar,
que não tem mais jeito, eu suspeito,
agora está perfeito, o tecido desse sonho,
onde eu vou pra te ver, vou devagar,
pra que estejas pronta, lá vem você,
pronta, vestida só um cetim,
vem pra mim, abre os braços,
estico os meus, abre os braços,
me puxa, eu cheguei, vim pra ti.


agora, estamos juntos, como não era há muito,
lá debaixo, ninguém nos enxerga,
eu sorrio, você olha pro horizonte,
risca com o dedo, minha fronte,
na minha testa desenha um sinal,
é assim que se desperta num sonho,
você me diz, eu te abraço forte,
a gente ri, de mais alto nossa risada ecoa,
quando chega a luz do dia,
ainda brilha, estrela da manhã,
me vem o que deve ser dito,
primeiro sussuro, depois repito.


mesmo que pareça perdido,
mesmo que esqueça o sentido,
coloco os louros sobre seu cabelo,
suas bodas eu vim coroar,
olha ali aquelas nuvens correndo,
olha lá um risco de luz no mar,
vejo por dentro sua relíquia, no peito,
dobro um joelho, baixo a cabeça, tomo sua mão,
moça-senhora pálida, não há profecia,
nem runa pra te guiar, pra cá ou pra lá,
sua direção de vida aponta, se preciso afronta,
seu desejo desmonta, o que mais não há.


ao fim, acena-me em anuência,
despedimo-nos sentidos, em silêncio,
volto à terra comum, descendo escadas em espiral,
olhando pra cima, te vendo, até acabar,
até ficar pesado, de pé no chão,
até regressar, deitando na solidão,
mas fica o perfume sutil desse encontro,
momentos que gravo e me confortam,
até que um dia voltemos,
até que a distância se desfaça,
até que não tenhamos mais,
que descalços errar.

13 março 2009

Balada sem nome

Ora, ora,
Hora, hora...
Eu digo e repito, duas vezes,
Porque essa coisa é do tipo,
Que se diz de par em par,
Eu não mudo isso, porque não convém,
Porque desde o início dos tempos, foi assim.

Essa história é um bom começo,
Pacto amarrado, embrulhado em xiste,
Depois que você começa,
Não tem volta, cabra,
Eu te aviso agora, não tem fim.

O que você tem que saber,
A única coisa que vale a pena, enfim,
É onde vai o termo dessa dança,
Porque ainda não tem a resposta,
O que o faz levantar todo dia,
O que não te deixa dormir?

Sabe bem, ó andarilho tosco,
Caminhante da volta torta,
Esse atalho que toma, à sorte,
Te levará de novo ao início,
Que seja ele um precipício,
Seja ele seu eterno porvir.

Se não toma esse caminho,
E afoito encontra a chave,
Torna-se ela a clave funesta,
Com a qual se escreve seu requiém,
Daí sim, a mortalha cega, terá de vestir.

Por isso, vira e mexe, te repito,
De maneira clara e bem honesta,
Volta e meia calará seu grito,
Mesmo abafado, não deixará de existir,
Vai com força, dar com a cara no muro,
Ou fica, a buscar seguro,
Onde não há nada pra te garantir?

02 março 2009

ainda que eu sangre


de tanto esperar e perder o tempo da espera,
perdi-me nuns corredores confusos sem fim,
dei voltas tortas à procura da figura, que será?
um espelho o que procuro, ou um muro alto assim?


de tanto calar e me alimentar do silêncio, confesso,
engodo bem urdido de dentro do peito ferido,
espera de um vale arejado sem chance de sucesso,
será minha armadilha pra mim meu passaporte perdido?


será a lança afamada do meu nome, feita pra me ferir,
será a sorte insidiosa que me consome capaz de me dobrar e ruir?
ou resta esperança que me console, milagre que desafogue,
manhã que me resgate da noite torpe, venha me ungir!