Durante toda a tarde daquele sábado, de clima quente e abafado, ela ficou no seu quarto. Queria que o mundo ficasse em silêncio. Que todas as coisas e pessoas se afastassem das paredes do quarto e ela pudesse ficar totalmente sozinha. Mas a tarde estava linda e isso fazia da piscina e do playground lá embaixo, tudo o que as famílias, crianças e jovens precisavam para fazer uma enorme algazarra, feliz e descontraída, com direito a churrasco e rádio pop pra acompanhar. Mesmo um pouco distantes, os sons e cheiros irritavam e agrediam Mariana. O mundo não dá um tempo quando a gente precisa...o mundo e a vida eram muito cruéis com ela nesse momento, era a base de todo aquele amontoado de emoções fortes que ela não conseguia controlar.
Quando o sol começou a se por, depois de várias crises de choro que foram indo e vindo até cansar, sua cara inchada e úmida começou a relaxar e seus olhos, que estavam vidrados no teto, piscaram cada vez mais longamente até que ela dormisse.
Numa penumbra quase total, Mariana esgueirava-se entre paredes irregulares e ásperas, estava sentindo um cheiro forte de mofo, apavorada, tentando nao raspar mais os braços já machucados pelas paredes, nem olhar para o chão, que devia ser de terra barrenta. Seu coração parecia estar inchando, quase estourando o peito. Ela não conseguia correr, mas andava e tropeçava, o mais rápido que podia, embora não surgisse nenhuma luz pra amenizar o desespero. Mariana estava com medo, com muito medo, nunca sentira tanto medo em toda sua vida.
Então ela ouviu um berro do seu lado, deu um salto e caiu toda torta, enrolada no lençol. Quando conseguiu respirar melhor e se situar, entendeu que o berro era do Siqueira do 6° andar. Ele queria que os últimos gatos pingados que ficaram bêbados no fim do churrasco, parassem de fazer barulho. Ela olhou no relógio, eram 23h15. Levantou apoiando-se na cama e cambaleou até o banheiro. Ao acender a luz sua cabeça doeu, como se estivesse numa ressaca daquelas e ao olhar no espelho, não sabia se ficava aliviada por ter acordado e saído do pesadelo ou se preferia voltar para ele, a ter que encarar aquela cara de zumbi de filme B.