
Será então a hora do ensaio, parar, enquanto o ano vai chegando ao fim. Serão, enfim.Umas horas ocas, não digo vazias, mas cheias de ecos, reverberando entre as paredes de memoráveis passados e possíveis futuros. Seremos sábios, ou burros, ao nos perdermos do presente, para vagar em tempos que não existem mais, que não se pode prever?
Não sei bem, dizer. Mas agora não me parece, de fato, que pudesse ser diferente. Visto que mesmo duros, ou frios, a gente sente, que depende desses tempos, fora do tempo presente. Para nos situarmos no rumo, para rever o caminho, fugir ao infortúnio, ou encontrar a coragem de partir do zero, por mais amarga que seja a sensação da derrota, se ainda nos bate à porta, a vontade e inconformação, então, terá de ser assim, por você, por mim.
Nesses dias raros, em que sai de minha casa e meu trabalho, para voltar aonde já foi meu lugar, assombra-me uma sensação de conforto junto aos meus, uma tranqüilidade mesmo, assim. Lembro de algumas pessoas, com quem convivo e agora estão distantes, mas essa memória nada me desperta além de um vago sorriso, um olhar para o nada, impreciso e desfocado. Um, sei lá, estado bom de saudade sem desalento.
Outra vez, em muitas das coisas comuns, me surgem acasos que parecem, tão bem cuidados, para me dizer, para não me deixar esquecer. As portas que ainda deixei fechadas, ou entreabertas, balançam com o vento, me chamando. Engraçado que, em outros tempos, esses gemidos e trancos do vento estavam acompanhados do grasnar sombrio de corvos, de gotas de chuva e céu nublado. Agora, apenas ouço o som que passa entre as árvores, da brisa que vira vento, do vento, que ao assobiar não me assunta mais. As portas batem, mas sem reclamar. Na luz estourada do dia, compõe sim um som, arranjo compassado. Não as temo mais, desejo voltar.
Não se trata mais de viagem melancólica ao passado, não mais uma viagem sonhada, em que eu deixe minha vida de lado, não. Vou agora conquistar o que havia deixado para trás e percebo que me é tão caro. Vou agora de peito mais leve encontrar no futuro o que perdi no passado e a vida continuou, obstinada, me ofercer, na praia, todos os dias, mas eu não enxergava. Agora posso ver, ouvir e sentir que me toca aos pés, trazido pela maré, pelos ciclos, os visíveis e desconhecidos.
Nessas horas, sorrio enquanto me espanto, ao viver, as portas surgindo e se transformando em presentes, vindo com as ondas, desmanchando-se em espuma. Eu os toco mais ainda não os sei capturar. Passam entre meus dedos, mas não há de que reclamar. Meu sorriso vira risada, pois só sinto a graça de enxegar e não saber ainda, o que nem como fazer.
Por hora essa risada me basta, irei torná-la muito mais a rir e a dizer.